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Fundamentação: Clonagem e Células-Tronco


O que é clonagem?
Clonar significa produzir uma cópia geneticamente idêntica de um indivíduo. A clonagem é uma forma de reprodução assexuada, ou seja, forma de reprodução que não envolve a união de um óvulo com um espermatozoide, no qual célula de um indivíduo adulto que é fundida com um óvulo anucleado, ou seja, sem núcleo.
O "embrião" gerado possui como conteúdo genético da pessoa que doou a célula, ou seja, um clone. O embrião gerado pela transferência nuclear inicia o desenvolvimento ainda no laboratório, dividindo se em duas células, quatro, oito, e assim sucessivamente até o estádio de blastocisto, onde ele é composto de 100 a 200 células. Nesse ponto ele pode ser transferido para o útero de uma fêmea receptora onde ele se desenvolverá até o nascimento.
Clone, do grego klón, 'rebento', 'broto'; conjunto de células ou organismos originários de outros por algum tipo de multiplicação assexual (divisão, enxertia, apomixia, etc.); Todos os membros de um clone têm o mesmo patrimônio genético; Cada uma das células, ou cada um dos organismos assim gerados; Clone obtido artificialmente: p. ex., inserindo o núcleo de uma célula somática num óvulo cujo núcleo foi adrede retirado[1].

Para compreender o que de fato realmente é a clonagem é necessário entender os seus tipos:
1º.  Clonagem reprodutiva
2º.  Clonagem embrionária
3º.  Clonagem terapêutica
Na clonagem reprodutiva este óvulo, agora com o núcleo da célula somática, tem de ser inserido em um útero. No caso da clonagem humana, a proposta seria retirar o núcleo de uma célula somática, que teoricamente poderia ser de qualquer tecido de uma criança ou adulto, inserir esse núcleo em um óvulo e implantá-lo em um útero (que funcionaria como uma barriga de aluguel).
Se esse óvulo se desenvolver, teremos um novo ser com as mesmas características físicas da criança ou adulto de quem foi retirada a célula somática. Seria como um gêmeo idêntico nascido posteriormente.
A clonagem embrionária é o processo que permite formar dói ou mais indivíduos a partir de um só embrião, que é dividido numa fase anterior à implantação no útero. É por este processo que a natureza gera os gêmeos idênticos. Através deste processo pode-se gerar a matriz e o clone ao mesmo tempo.
A clonagem terapêutica é a transferência de núcleos de uma célula para um óvulo sem núcleo. Ela nada mais é do que um aprimoramento das técnicas hoje existentes para culturas de tecidos, que são realizadas há décadas. A grande vantagem é que, ao transferir o núcleo de uma célula de uma pessoa para um óvulo sem núcleo, esse novo óvulo ao dividir-se gera, em laboratório, células potencialmente capazes de produzir qualquer tecido. Isso abre perspectivas fantásticas para futuros tratamentos, porque hoje só é possível cultivar em laboratório células com as mesmas características do tecido de onde foram retiradas.

Quais são os problemas éticos advindos da clonagem?
A clonagem como forma de reprodução de seres humanos é internacionalmente repudiada e uma ameaça à dignidade do ser humano, da mesma forma que a tortura, discriminação racial, o terrorismo etc. Em suma, a clonagem como forma de reprodução é um procedimento caracterizado pelo desconhecido, comprovadamente perigoso, e que não deve ser realizados em seres humanos.
Muitos a consideram como a alternativa do futuro para casais que não podem gerar filhos. A humanidade agradecerá muito mais se, ao invés de se fazerem clonagens, forem descobertos métodos para regenerar células reprodutivas de pessoas estéreis.
Com tantas alternativas para a perpetuação da espécie humana, a clonagem se faz desnecessária, além de perigosa se feita por mentes mal intencionadas. Além disso, não faz o menor sentido a hipótese de que a clonagem permitiria que pessoas queridas, importantes e inteligentes voltem à vida, ou seja, replicadas. Não é preciso ser um biólogo para saber que o DNA determina como deve ser o cérebro de cada um, mas não determina como deve ser sua personalidade.
A clonagem reprodutiva é errada porque priva as pessoas de uma identidade própria, o que é um mal que fere a sua identidade. A clonagem reprodutiva é errada porque cria relações familiares artificiais e atípicas.  No entanto, a clonagem humana trará obrigatoriamente alteração nas relações familiares, pois não será fácil decidir quem é o pai ou a mãe. Devemos impedir com moderação a banalização da clonagem tendo em mente preservar e proteger a dignidade e respeitabilidade humana.

Qual o posicionamento pastoral diante da clonagem?
O propósito verdadeiro de Deus é a reprodução mediante filhos e não mediante clonagens. Clonagem é mexer com a vida que Ele dá, a Bíblia enfatiza muito a vida. Assim é necessário que pastores e teólogos busquem estar no centro da vontade de Deus, orando e fazendo um estudo sistemático da bíblia, para que encontrem respostas de Deus para os homens com respeito à clonagem humana, e não respostas de homens para homens.
A clonagem fere o sentido de identidade da pessoa como ser singular e autônomo criado à imagem e semelhança de Deus. E o que é mais inaceitável ainda é que as relações fundamentais da pessoa, tais como a consanguinidade, a filiação, o parentesco, a maternidade e a paternidade, no processo de clonagem, ficam completamente distorcidas e ofuscadas. Que Deus ilumine pastores e teólogos para que compreendam a Sua vontade
 A clonagem não é humana, ao contrário, é desumanizadora e derpersonalizante; não respeita o ideal moral da reprodução da vida humana através da sexualidade. Pela fé, ou seja, como forma de elevarmos é mais alta dignidade a vida humana, dizemos que o ser humano, através da sua dimensão sexual, é gerador de vida humana enquanto colaborador de Deus criador.
Células-tronco.

               As células-tronco, também conhecidas como células-mãe ou, errôneamente, como células estaminais, são células que possuem a melhor capacidade de se dividir dando origem a células semelhantes às progenitoras. Células-tronco são as células com capacidade de auto replicação, isto é, com capacidade de gerar uma cópia idêntica a si mesma e com potencial de diferenciar-se em vários tecidos.
As células-tronco dos embriões têm ainda a capacidade de se transformar, num processo também conhecido por diferenciação celular, em outros tecidos do corpo, como ossos, nervos, músculo e sangue. Devido a essa característica, as células-tronco são importantes, principalmente na aplicação terapêutica, sendo potencialmente úteis em terapias de combate a doenças cardiovasculares, neurodegenerativas, diabetes tipo-1 acidente vascular cerebral, doenças hematológicas, traumas na medula espinhal e nefropatias.
O principal objetivo das pesquisas com células-tronco é usá-las para recuperar tecidos danificados por essas doenças e traumas. São encontradas em células embrionárias e em vários locais do corpo, como no cordão umbilical, na medula óssea, no sangue, no fígado, na placenta e no líquido amniótico. Nesse último local, conforme descoberta de pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade de Wake Forest, no estado norte-americano da Carolina do Norte, noticiada pela imprensa mundial nos primeiros dias de 2007.
Questão do nome
O adjetivo estaminal refere-se aos estames e provém da palavra latina 'staminale-', adjectivo relacionado com o substantivo latino ‘stamine’, do qual deriva a palavra portuguesa estame, que significa: fio de tecer e, em botânica, folha floral fértil que produz os grânulos do pólen, e filete que sustenta a antera onde se encontram os grânulos de pólen. O vocábulo inglês correspondente é "stam". Nada disto tem a ver com o significado atribuído ao conceito que é internacionalmente conhecido como stem cells. O vocábulo inglês "stem" provém da palavra germânica "stamn", que significa caule e estrutura de planta. Em linguística, "stem" significa raiz. Como os estames possuem os grânulos do pólen, alguns cientistas pensaram que a palavra estaminal poderia ser adequada para a tradução do adjectivo relacionado com a palavra "stem" no contexto "stem cell".
Para fazer injustiça ao significado biológico destas células, tendo em conta a ampla divulgação que têm nos órgãos de comunicação social, a tradução literal para células-tronco, comum no Brasil, também traz problemas de inteligibilidade, pois se relaciona com uma imagem abstracta do processo de diferenciação e especialização celulares, que "entronca" em células pluripotentes e se ramifica em células progressivamente unipotentes. O mesmo problema de inteligibilidade põe-se com o termo células-mãe, que para, além disso, é confuso.
Para esta questão ser ultrapassada, o mais adequado será traduzir stem cell por célula indiferenciada ou célula básica. Outras hipóteses serão os termos células germinais ou células geradora.

Extração das células-tronco

As células-tronco podem se classificar de acordo com o tipo de células que podem gerar:
  • Totipotentes: podem produzir todas as células embrionárias e extra embrionárias; aquelas células que são capazes de diferenciarem-se em todos os 216 tecidos que formam o corpo humano, incluindo a placenta e anexos embrionários. As células totipotentes são encontradas nos embriões nas primeiras fases de divisão, isto é, quando o embrião tem até 16 - 32 células, que corresponde a 3 ou 4 dias de vida;
  • Pluripotentes ou multipotentes, aquelas células capazes de diferenciar-se em quase todos os tecidos humanos, excluindo a placenta e anexos embrionários, ou seja, a partir de 32 - 64 células, aproximadamente a partir do 5º dia de vida, fase considerada de blastocisto. As células internas do blastocisto são pluripotentes enquanto as células da membrana externa destinam-se a produção da placenta e as membranas embrionárias; podem produzir todos os tipos celulares do embrião, menos placenta e anexos; podem produzir células de várias linhagens;
  • Oligopotentes: podem produzir células dentro de uma única linhagem; aquelas células que se diferenciam em poucos tecidos;
  • Unipotentes: produz somente um único tipo celular maduro, aquelas células que se diferenciam em um único tecido.
Quanto a sua natureza, podem ser:

Adultas, extraídas dos diversos tecidos humanos, tais como, medula óssea, sangue, fígado, cordão umbilical, placenta etc. (estas duas últimas são consideradas células adultas, haja vista a sua limitação de diferenciação). Nos tecidos adultos também são encontradas células-tronco, como medula óssea, sistema nervoso e epitélio. Entretanto, estudos demonstram que a sua capacidade de diferenciação seja limitada e que a maioria dos tecidos humanos não podem ser obtida a partir delas.

Embrionárias, só podem ser encontradas nos embriões humanos e é classificado como totipotentes ou pluripotentes, dado seu alto poder de diferenciação. Estes embriões descartados (inviáveis para a implantação) podem ser encontrados nas clínicas de reprodução assistida ou podem ser produzidos através da clonagem para fins terapêuticos.
Aspectos éticos.
Apesar desses argumentos, o uso de células-tronco embrionárias para fins terapêuticos, obtidas tanto pela transferência de núcleo como de embriões descartados em clínicas de fertilização, é defendido por todos aqueles, e são muitos, que poderão beneficiar-se com a aplicação dessa técnica e pela maioria dos cientistas.
As 63 academias de ciência do mundo, que se posicionaram contra a clonagem reprodutiva, defendem as pesquisas com células embrionárias para fins terapêuticos. Em relação aos que acham que a clonagem terapêutica pode abrir caminho para clonagem reprodutiva, devemos lembrar que existe uma diferença intransponível entre os dois procedimentos: a implantação e a não implantação em um útero humano. Basta proibir a implantação no útero.
Se pensarmos que qualquer célula humana pode ser teoricamente clonada e gerar um novo ser, poderemos chegar ao exagero de achar que toda vez que tiramos a cutícula ou arrancamos um fio de cabelo, estamos destruindo uma vida humana em potencial. Afinal, o núcleo de uma célula da cutícula poderia ser colocado em um óvulo enucleado, inserido em um útero e gerar uma nova vida.
Por outro lado, a cultura de tecidos é prática comum em laboratório, apoiada por todos. A única diferença, no caso, seria o uso de óvulos, quando não fecundados são apenas células, que permitiriam a produção de qualquer tecido no laboratório. Ou seja, em vez de poder produzir apenas um tipo de tecido, já especializado, o uso de óvulos permitiria fabricar qualquer tipo de tecido. O que há de antiético nisso?
Quanto ao comércio de óvulos, não seria a mesma coisa do que já ocorre com o transplante de órgãos? Não é mais fácil doar um óvulo do que um rim? Cada um de nós pode fazer a si próprio esta pergunta: “Eu doaria um óvulo para ajudar alguém? Para salvar uma vida?”.
No que se refere à destruição de “embriões humanos”, novamente devemos lembrar que estamos falando de cultivar tecidos ou, futuramente, órgãos a partir de embriões que são normalmente descartados e que nunca serão inseridos em um útero. Sabemos que 90% dos embriões gerados em clínicas de fertilização e inseridos num útero nas melhores condições possíveis não geram vida. Além disso, um trabalho recente mostrou que células obtidas de embriões de má qualidade, que não teriam potencial para gerar uma vida, mantêm a capacidade de gerar linhagens de células-tronco embrionárias e, portanto, de gerar tecidos.
Em resumo, é justo deixar morrer uma criança ou um jovem afetado por uma doença neuromuscular letal para preservar um embrião cujo destino é o lixo? Um embrião que, mesmo implantado em um útero, teria potencial baixíssimo de gerar um indivíduo? Ao usar células-tronco embrionárias para regenerar tecidos em uma pessoa condenada por uma doença letal, na realidade não estamos criando vida? Isso não é comparável ao que se fazem hoje nos transplantes, quando se retira os órgãos de uma pessoa com morte cerebral, mas que poderia permanecer em vida vegetativa indefinidamente?
É extremamente importante que as pessoas entendam a diferença entre clonagem humana, clonagem terapêutica e terapia celular com células-tronco embrionárias antes de assumir uma posição contrária. Por outro lado, também não podemos acreditar que as células-tronco sejam capazes de curar todas as doenças humanas. As pesquisas que estão se iniciando agora serão fundamentais para responder inúmeras questões sobre o potencial das células-tronco adultas em comparação com o das embrionárias, sobre as doenças que poderão ser tratadas e quais serão os benefícios e riscos da terapia celular.
Quando a Bioética olha para a questão da Clonagem Terapêutica, os obstáculos éticos se multiplicam. "No caso da clonagem, os embriões são produzidos já com o objetivo específico de gerar células-tronco e a partir delas, tecidos e órgãos. Em vez de reproduzir por inteiro uma pessoa, um clone ou gêmeo tardio, se cria um pedaço dele. Se todos os países baniram a clonagem reprodutiva porque não banir a dita clonagem "terapêutica", que na realidade também não passa de reprodução, só que de pedaços do corpo? É moralmente relevante distinguir duas espécies de clonagem, se na realidade elas objetiva a mesma coisa, isto é reproduzir?”.
Limitações éticas e jurídicas à pesquisa e manipulação de células-tronco.
Etimologicamente, o termo ético deriva do grego ethos que significa modo de ser, caráter. Designa a reflexão filosófica sobre a moralidade, isto é, sobre as regras e os códigos morais que norteiam a conduta humana. Sua finalidade é esclarecer e sistematizar as bases do fato moral e determinar as diretrizes e os princípios abstratos da moral.
Os valores podem ser entendidos como padrões sociais ou princípios aceitos e mantidos por pessoas, pela sociedade, dentre outros. Assim, cada um adquire uma percepção individual do que lhe é de valor; possuem pesos diferenciados, de modo que, quando comparados, se tornam mais ou menos valiosos. Tornam-se, sobre determinado enfoque, subjetivos, uma vez que dependerão do modo de existência de cada pessoa, de suas convicções filosóficas, experiências vividas ou até, de crenças religiosas.
Os juristas, os cientistas, os médicos devem dar a sua contribuição para a busca da justiça, da vida, da liberdade, para que se possa, eticamente, formar a consciência das pessoas que participarão do debate que ora se forma. É necessário que a humanidade reflita sobre o princípio da responsabilidade científica e social e que a racionalidade ética caminhe a passos largos, disputando palmo a palmo, um espaço junto ao progresso científico e tecnológico.
Mas como conciliar, neste momento, ética, moral e os conhecimentos jurídicos existentes? Como valorar a pesquisa humana frente aos benefícios que traria à vida humana? Qual o mais importante: o bem coletivo ou a não manipulação do material genético humano?
A legislação do Brasil, diriam uns, autoriza a pesquisa com células-tronco adultas. Como então afirmar que a Constituição veda a manipulação de material genético? Sim, a legislação permite, mas proíbe totalmente a clonagem terapêutica de seres humanos e, em muitos casos, o tratamento apenas com células-tronco adultas não é suficiente para amenizar a dor dos pacientes.
Visto apenas do ponto ético e moral, é fácil aos parlamentares dizerem que está proibida a pesquisa e eles nada podem fazer. Todavia, o que fazer quando se tem um parente, portador de doença que poderia ser facilmente amenizada com o uso da clonagem terapêutica, se definhar aos poucos, à frente de seus olhos?
O Direito, acima de tudo, se resume em bom senso e razoabilidade. Deve ser aplicado sempre se tendo em vista o bem comum. E as pesquisas com células-tronco, ao que consta até hoje, possui em potencial tudo aquilo necessário a uma vida melhor, tratando doenças graves, até hoje sem solução e amenizando tantas outras.
Reconhecendo que nem tudo que é cientificamente possível de ser realizado é, portanto, eticamente aceitável, tal linha de raciocínio nos conduz à reflexão que se consolidou a partir da necessidade em se reconhecer o valor ético da vida humana e recolher subsídios para conciliar o imperativo do desenvolvimento tecnológico e a proteção da vida e da qualidade de vida. O grande desafio enfrentado pela Bioética é conciliar o saber humanista com o saber científico.
Assim, o profissional da área jurídica, ao se deparar com as novas indagações surgidas em decorrência de tecnologias modernas, deve sempre garantir os princípios constitucionais, visto que a legislação não consegue acompanhar a revolução tecnológica mundial.
Ressalta-se que o direito, como mantenedor da ordem social, deve, com prudência, conhecimento interdisciplinar e cautela e, principalmente, valendo-se dos princípios e conceitos bioéticos, regulamentar a matéria. E a Lei de Biossegurança, por mais tímida que tenha sido, traz consigo grande avanço e esperança para os brasileiros em estado aflitivo decorrente de sérias deficiências do corpo e da mente.
Avanços científicos, como o uso terapêutico de células-tronco, reacendem discussões entre a fé e o saber.
Levantar a bandeira das células-tronco pode parecer um caminho inevitável, já que a causa dos portadores de deficiência e dos doentes crônicos é simpática a todos. Mas um dos maiores erros é simplificar a questão e tratá-la da maneira maniqueísta. “O debate sobre as pesquisas com células-tronco embrionárias foi conduzido de forma equivocada e permeada por dogmas, paixões e preconceitos dos dois lados. Enquanto um não aprender a respeitar a opinião do outro e ser mais flexível, ciência e religião não vão se entender”, pondera o Reinaldo Ayer de Oliveira, professor de bioética da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (USP).
Ele já promoveu debates entre cientistas e sociedade civil – dentre os quais, diversos grupos religiosos – sobre variados temas. “Uma vez discutimos a questão da doação de sangue. Participaram representantes das Testemunhas de Jeová, que apresentaram os motivos pelos quais não doam. Ora, a comunidade científica pode até discordar, mas precisa respeitar essas posturas”, defende. “As crenças são importantes em qualquer debate ético e precisam ter voz. É um grande erro querer excluí-las desse processo. E é obrigação moral do cientista informar a sociedade sobre seu trabalho, sobretudo se envolve temas como eutanásia, aborto e reprodução assistida.”, prossegue Reinaldo.
“O pensar teológico não acompanhou o desenvolvimento científico. Acredito que teremos muitos outros dilemas éticos com os avanços do saber”, observa, por sua vez, o teólogo e pastor Lourenço Stelio Rega, professor da cadeira de ética e diretor da Faculdade Teológica de São Paulo. “O homem não é um ser amoral. Há valores que o movem em tudo o que faz inclusive nas pesquisas científicas.” O pastor diz que o grande problema ético se deve mesmo às diferentes opiniões sobre o momento em que a nova vida tem início. “Para quem acredita que isso se dá apenas quando o óvulo fecundado se fixa no útero feminino ou mesmo quando o bebê começa a respirar no nascimento, não há dificuldades. Entretanto, para aqueles que creem que a nova vida começa na concepção, destruir um embrião equivale a assassinar uma pessoa”, explica.
Entre os crentes, há duas correntes principais: uma apoia as pesquisas porque considera que a vida só começa a partir da formação do sistema nervoso, cerca de duas semanas após a concepção. “Outra defende a preservação do embrião desde o encontro do espermatozoide com o óvulo, posição idêntica à do catolicismo”, continua Lourenço. Mas ele critica as igrejas evangélicas por, ao contrário da Católica, não declararem oficialmente suas posições. “Agindo assim, demonstram pouca preocupação ética. Em geral, a teologia evangélica valoriza muito a salvação, mas subestima a vida cotidiana e a prática. Resultado – hoje, quando se fala em posição da Igreja, menciona-se apenas a posição católica, que, devido ao silêncio protestante, se tornou a opinião cristã oficial”.
Preencher esta lacuna é um do objetivo do encontro que o Conselho Nacional de Igrejas Cristãs (Conic) promove no mês de agosto envolvendo as principais lideranças evangélicas do Brasil, inclusive pentecostais. O Conic congrega denominações de linha tradicional, como a Presbiteriana, a Luterana e a Metodista, entre outras, e também conta com a participação da Igreja Católica. “Queremos elaborar uma pauta ecumênica sobre a questão da bioética, incluindo temas como aborto de anencefálicos, além das células-tronco”, antecipa o bispo metodista Adriel de Souza Maia, presidente do órgão. “Tal debate é de fundamental importância, porque as coisas estão acontecendo e a Igreja precisa ter uma posição pastoral e profética dentro da sociedade”, sustenta.
Embora ressalve que o Conic ainda não tem posição oficial, Adriel se diz pessoalmente favorável aos experimentos: “Eu acho que toda a pesquisa científica tem um tremendo valor para a fé cristã. É legítimo buscar melhorar a qualidade de vida das pessoas. A questão ética é outra coisa”, diz o religioso, que também é um dos líderes da Campanha da Fraternidade deste ano, promovida pela CNBB em parceria com o Conic. A entidade convidou o pastor e médico Carlos Alberto Bezerra Jr, que também é vereador pelo PSDB em São Paulo, para coordenar as discussões sobre temas científicos junto às igrejas evangélicas. “A Igreja tem muito a falar e dessa vez temos uma oportunidade histórica. Porém, o debate deve ser antes amadurecido em nosso meio. Tudo dentro de uma ética bíblica que leve em conta os avanços da ciência e não negue o valor da vida”, discursa o parlamentar.
Bezerra está preocupado com eventuais desvios que podem advir da aprovação da Lei de Biossegurança. Um deles é justamente o abuso nos procedimentos com embriões. Para tanto, o vereador elaborou um projeto de lei que proíbe a comercialização e mesmo a doação deles para fins de pesquisa. “Esse é o momento em que devemos estar atentos, vigiando o que acontece e coibindo desvios. Mas não podemos parar por aí”, afirma. Em sua opinião, o controle rígido do governo pode ser a chave para o problema. “Deveria ser criado um banco governamental de embriões, uma espécie de hemocentro, para receber os óvulos fecundados. O tempo para o uso e a forma de descarte também precisam ser mais bem regulamentados”, aponta.
 Autor do livro Ético cristão (CPAD), o pastor Elinaldo Renovato de Lima, da Assembleia de Deus de Natal (RN), lembra que a vida não é só matéria. “O aspecto espiritual é de suma importância nas considerações sobre o que se deve ou não fazer.” Ele teme que o utilitarismo acabe relevando essas questões a um plano secundário. “Cientistas têm grande valor, pois seu trabalho resulta em grandes benefícios. No entanto, quando eles só levam em conta o que veem diante de seus olhos nas pranchetas e microscópios, tornam-se frios e sem ética.” Ele cita o salmo 139 com demonstração do valor que Deus dá à vida humana – seja em que estágio for: “A Bíblia diz que os olhos do Senhor veem o corpo ainda informe, entretecido no seio da mãe. O embrião não é um simples aglomerado de células, mas uma pessoa” sentencia.

Vaticano condena células-tronco e clonagem
12 de dezembro de 2008 • 12h42 • atualizado às 13h47
Vaticano disse que a vida é sagrada em qualquer estágio de sua existência, e condenou a fertilização artificial, a pesquisa de células-tronco embrionárias, a clonagem humana e as pílulas anticoncepcionais.
O documento sobre bioética do corpo doutrinal do Vaticano, aguardado há muito tempo, os remédios que bloqueiam a ação dos hormônios necessária para manter um óvulo fertilizado no útero caem "no pecado do aborto" e são gravemente imorais.
"Dignitas Personae (dignidade de uma pessoa), uma instrução sobre algumas questões bioéticas", é uma tentativa de atualizar a postura da Igreja diante dos recentes avanços na ciência e na medicina. O texto afirma que a vida humana merece respeito "desde os primeiros estágios de sua existência, (e) não pode nunca ser reduzida meramente a um conjunto de células.”.
"Portanto, o embrião humano tem, desde o começo, a dignidade que cabe a uma pessoa", diz o documento da Congregação para a Doutrina da Fé. Ele diz que a maioria das formas de fertilização artificial "precisa ser extinta" porque "substitui o ato conjugal... que é o único capaz verdadeiramente de uma procriação responsável.”.
A Igreja condenou a fertilização in-vitro, dizendo que as técnicas "atuam como se o embrião humano fosse simplesmente uma massa de células para serem usadas, selecionadas e descartadas." O documento, altamente técnico, afirma que apenas a pesquisa com células-tronco adultas é moral, porque a pesquisa com células-tronco embrionárias envolve a destruição de embriões.
No documento, o Vaticano também defendeu o direito de intervir nesses assuntos. "Há quem diga que o ensinamento moral da Igreja contém proibições demais. Na realidade, porém, esse ensinamento é baseado no reconhecimento e na promoção de todos os dons que o Criador presenteou ao homem: como a vida, o conhecimento, a liberdade e o amor."

Leis nacionais

Os que dizem as leis de alguns países sobre a clonagem de células troncam.
  • África do Sul - permite todas as pesquisas com embriões, inclusive a clonagem terapêutica. É o único país africano com legislação a respeito.
  • Alemanha - permite a pesquisa com linhagens de células-tronco existentes e sua importação, mas proíbe a destruição de embriões.
  • Brasil - permite a utilização de células-tronco produzidas a partir de embriões humanos para fins de pesquisa e terapia, desde que sejam embriões inviáveis ou estejam congelados há mais de três anos. Em todos os casos, é necessário o consentimento dos pais. A comercialização do material biológico é crime. Em 29 de maio de 2008 o Supremo Tribunal Federal confirmou que a lei em questão é constitucional, ratificando assim o posicionamento normativo dessa nação.
  • China - permite todas as pesquisas com embriões, inclusive a clonagem terapêutica.
  • Cingapura - permite todas as pesquisas com embriões, inclusive a clonagem terapêutica.
  • Coréia do Sul - permite todas as pesquisas com embriões, inclusive a clonagem terapêutica.
  • Estados Unidos - proíbe a aplicação de verbas do governo federal a qualquer pesquisa envolvendo embriões humanos, a exceção é feita para 19 linhagens de células-tronco derivadas antes da aprovação da lei norte-americana. Mas estados como a Califórnia permitem e patrocina esse tipo de pesquisa, inclusive a clonagem terapêutica.
  • França - não tem legislação específica, mas permite a pesquisa com linhagens existentes de células-tronco embrionárias e com embriões de descarte.
  • Índia - proíbe a clonagem terapêutica, mas permite as outras pesquisas.
  • Israel - permite todas as pesquisas com embriões, inclusive a clonagem terapêutica.
  • Itália - proíbe totalmente qualquer tipo de pesquisa com células-tronco embrionárias humanas e sua importação.
  • Japão - permite todas as pesquisas com embriões, inclusive a clonagem terapêutica.
  • México - único país latino-americano além do Brasil que possui lei permitindo o uso de embriões. A lei mexicana é mais liberal que a brasileira, já que permite a criação de embriões para pesquisa.
  • Reino Unido - tem uma das legislações mais liberais do mundo e permite a clonagem terapêutica.
  • Rússia - permite todas as pesquisas com embriões, inclusive a clonagem terapêutica.
  • Turquia - permite pesquisas e uso de embriões de descarte, porem proíbe a clonagem terapêutica das células tronco.



Conclusão
O tema proposto vem movimentando a opinião pública do mundo todo e contingente impressionante de operadores da ciência genética, do direito, das áreas da saúde e social, além de diversos outros segmentos. Trata-se de se saber quais os limites éticos, morais e jurídicos que devem ser respeitados, visto a enorme expectativa criada por estas pesquisas, e quais as consequências diretas na vida de todos aqueles que poderiam ser salvos ou ter sua saúde restabelecida pela terapia celular.
Ao homem cabe a consciência de que não se deve brincar de Deus, porém se Ele dotou os seres humanos de inteligência suficiente para criar e produzir a vida, nas suas mais variadas formas, por que não utilizá-la?
Não podemos deixar de reconhecer que a engenharia genética é mais uma etapa na evolução da espécie humana. Indagações acerca do próprio mistério da vida, das debilidades humanas e do prolongamento de uma vida mais saudável, podem ser facilmente dissolvidas por pesquisas que tenham como cerne a manipulação de células-tronco. O que não podemos permitir é que, em nome da ciência, vidas humanas sejam eliminadas. O valor da pessoa humana não pode se perder em meio a um turbilhão de articulações éticas e morais decorrentes unicamente do materialismo, do poder e da hipocrisia.
As novas biotecnologias representam um desafio para o Direito, tendo este por tarefa primordial não somente assegurar o direito à vida e a dignidade humana, mas também a de garantir a integridade das gerações futuras. Ao Direito não cabe impor barreiras ou estabelecer divisas morais e religiosas instransponíveis, mas sim disciplinar fato que, inevitavelmente, venham a surgir em decorrência da evolução humana. Por isso que se diz que o Direito é dinâmico.
A biotecnologia vem ganhando progresso mundo afora e, por conseguinte, as normas que a disciplinam, a integrarem o chamado Biodireito. O Brasil não poderia ficar distante desse processo.
Referencias Bibliográficas:
Compêndio de enfermagem em transplante de células tronco, Editora Maio, Curitiba – Pr, 2004;
Ciência e Cultura: Revista da Sociedade Brasileira para o progresso da Ciência, ano 56, número 03, 2004, São Paulo – SP;
Pereira, Lygia da Veiga, Clonagem: fatos & mitos, Editora Moderna, São Paulo – SP, 2002;
Arantes, Olivia Marcia Nagy, O que é preciso saber sobre clonagem e transgênicos, Edições Loyola, São Paulo – SP, 2003.


 

 




[1] HOLANDA, Aurélio Buarque de. Dicionário Aurélio Eletrônico Século XXI. Ed. Léxicon Informática ltda.1999.

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